quarta-feira, 6 de abril de 2011

Alguns reflexos da emenda constitucional n.º66/2010


Em 14 de julho de 2010, entrou em vigor a emenda constitucional de n.º 66, que teve como objetivo a modificação do §6º do art.226 de nossa Carta Magna.

Tais alterações incidiram diretamente sobre o instituto do divórcio, tendo, no entanto, na opinião de alguns juristas, afetado reflexivamente outros pontos do direito de família, sobretudo, o que se relaciona ao da separação judicial.

O antigo texto do mencionado dispositivo determinava que: “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos”.

E com as alterações introduzidas pela emenda, o mesmo passou a ser: “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio."

Assim, o divórcio poderia se dar de duas formas: direta e indireta.

Para o divórcio direto era preciso a separação de fato do casal por 2 anos, comprovada pelo decurso do prazo ou por declaração de testemunha. Já o divórcio indireto se dava com a conversão da prévia separação judicial por um período de mais de um ano. Entretanto, para que o pedido da separação judicial pudesse ser feito, ainda que de forma consensual, era preciso o decurso do prazo de 01 ano de casamento. 

Sabe-se que o divórcio só foi permitido em nosso direito a partir da emenda constitucional n.º 09/1977. Até então, vigorava o princípio da indissolubilidade do vínculo matrimonial, podendo ser desfeita apenas a sociedade conjugal por meio dos institutos da separação judicial, o famigerado desquite, e pela separação de corpos, advinda do direito canônico. 

Tal foi o posicionamento adotado pelo Código de 1916, abarcado pela Constituição de 1934. Aliás, este foi o único instrumento jurídico a dar tratamento constitucional para a questão, pois as constituições seguintes, a de 1937, a de 1946 e a de 1967, pregavam apenas a indissolubilidade do matrimônio, e silenciavam quanto à separação, subtendendo-se que a mesma continuava regrada pela lei civil apenas.

Em 1977, contudo, tal panorama mudou.

O divórcio passou a ser permitido e regulado em vias constitucionais, determinando o §1º do art. 175 que a concessão do mesmo só seria possível após 3 anos de separação judicial. 

Segundo, Luis Felipe Brasil Santos o regramento constitucional da matéria viria como uma garantia para amparar os antidivorcistas, já que não poderia o legislador ordinário alterar as condições constitucionalmente estabelecidas para o divórcio.

Desse modo, a emenda constitucional n.º66/2010 teria retirado tais critérios da ordem constitucional, restando a matéria novamente regulada apenas pelo Código Civil.

Tal seria o argumento a fundamentar uma das três teses relacionadas aos reflexos produzidos pela emenda. Esta tese defende que o texto da mesma contém uma norma de eficácia plena, mas mediata, que não revogou os critérios estabelecidos pela lei civilista para a obtenção do divórcio, critérios esses que precisam ser modificados pelo legislador infra-constitucional, havendo uma compatibilização entre a lei ordinária e a constitucional. Logo, para esta corrente, a emenda não teria sido capaz de implementar o divórcio direto.

Já segunda teoria desenvolvida, e oposta a primeira, defende que a emenda trouxe uma norma de eficácia plena e imediata, revogando os critérios civilistas estabelecidos, extinguindo o instituto da separação judicial, e conseqüentemente, a perquirição de culpa para dissolução da sociedade conjugal nos casos de separação judicial litigiosa, em que só o cônjuge inocente era legitimo para propor a ação. 

Por fim, a terceira tese, colocada de maneira intermediária entre as outras duas, sustenta que o divórcio direto já poderia ser aplicado, continuando a valer, contudo, as regras de separação estipuladas pelo CC. Dentro dessa corrente, há quem sustente ainda que no caso da separação não haveria mais o prazo estabelecido para o seu pleito, quer seja, duração do casamento por pelo menos 01 ano.

Desse modo, e antes que o caro leitor possa associar o presente post a um famoso jargão do mestre Chacrinha, “Eu não vim para esclarecer, vim para confundir”, digo que nem a prática logrou demonstrar ainda um entendimento pacificado sobre a matéria.

Em pesquisa realizada pela Associação Paulista dos Magistrados, em setembro de 2010, segundo notícia veiculada no site do Tribunal de Justiça de São Paulo, dos 557 juízes que responderam à mesma, 292 disseram que a nova legislação não abolia o instituto da separação judicial e 265 afirmaram que sim.

Opondo-se a esta informação, segue abaixo vídeo veiculado pelo canal oficial do STF na rede, com uma entrevista da advogada especialista em Direito de Família Sibele Salgado sustentando a possibilidade de já se aplicar o divórcio direto.

Além disso, a jurisprudência parece se alternar também entre as correntes.

Entretanto, há de se inferir sobre as diversas opiniões, um consenso de que a motivação do legislador constitucional, ao retirar os prazos necessários ao divórcio, facilitando a sua concessão, parece ir ao encontro da contemplação dos princípios da liberdade, da autonomia da vontade, da celeridade e economia processuais. Resta saber se tal tem aplicação imediata ou se a matéria deverá ser regulamentada também no plano infra-constitucional, bem como se a extinção do instituto da separação judicial poderia levar à banalização do casamento. 

Fiquemos, portanto, atentos aos próximos passos do legislador ou dos tribunais superiores, responsáveis por uniformizar a matéria.



Fontes:


SCHAFER, Gilberto.A Emenda Constitucional nº66/10 no Brasil e o divórcio no Brasil. Disponível em http://jus.uol.com.br/revista/texto/17125/a-emenda-constitucional-no-66-e-o-divorcio-no-brasil

DIAS, Maria Berenice. Enfim, o fim da separação. Disponível em http://magrs.net/?p=13907

SANTOS, Luis Felipe Brasil. Emenda do Divórcio: Cedo para comemorar. Disponível em: http://magrsnet/?p=14055


Um comentário:

  1. Fernanda,
    A Câmara está analisando o projeto de Lei 7.661/10 do deputado Sérgio Barradas Carneiro (PT/BA). O objetivo do projeto é adequar a lei à Emenda Constitucional analisada nesse post, acabando com os institutos da separação judicial e de fato.
    Para ter acesso ao projeto o link: http://www.camara.gov.br/internet/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=483750
    Como a proposta tramita em caráter conclusivo, rito de tramitação pelo qual não precisa de votação pelo Plenário, apenas pelas comissões designadas para analisá-lo, talvez em breve já venha a alteração no Código Civil. Vamos aguardar...

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