terça-feira, 12 de julho de 2011

Você sabia que o nome da LICC mudou?

Sim, em 30 de dezembro de 2010, publicou-se a Lei de nº 12.376, que traz a alteração do título desta de Lei de Introdução ao Código Civil para Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB

A mudança tem sido criticada. Não pela questão da escolha do novo nome, mas pelo fato de ter o legislador mobilizado forças para efetuar uma mudança tão rasa em uma lei que se encontra há muito defasada.

A verdade é que a lei, de fato não é apenas uma lei destinada ao âmbito civil, como o seu antigo nome fazia presumir. Nesse ponto, a mudança do nome é festejada, porque adéqua o título, até então incompatível, ao contexto da lei.

Isto porque a antiga LICC apresenta dispositivos que se destinam a reger a própria aplicação da norma no direito pátrio, trazendo dispositivos, assim, aplicáveis em todos os ramos do Direito.

Dessa forma, diferentemente do que pretendeu o legislador, a alteração do nome não ampliou o campo de aplicação da lei, vez que esse sempre se encontrou ampliado pelo manejo daquela.

Destarte, a lei apresenta normas e princípios que se dedicam ao conflito de leis no tempo, ao conflito de leis no espaço, a questões conexas como a de homologação de sentenças estrangeiras.

Além disso, há de se considerar o Direito Internacional Privado (DIP) como exemplo de um dos ramos do Direito, cuja disciplina encontra-se em alguns dos artigos da antiga LICC.

Este ramo, entre outros aspectos, é chamado a resolver casos em que mais de um ordenamento jurídico apresenta-se potencialmente aplicável ao mesmo. Tal tem se mostrado cada vez mais corriqueiro com a evolução humana, derrubando barreiras territoriais por meio da globalização, e criando situações de interação a que o Direito é chamado para reger.

Dessa forma, a LINDB determina os critérios em que a lei pátria deverá reger o caso em matéria de obrigações, direito de família e sucessão hereditária, por exemplo.

Tem-se, contudo, que a mesma se encontra inadequada ao atual estágio doutrinário e jurisprudencial relativos à evolução das normas do sobredireito (as normas de DIP são, assim, conhecidas vez que não resolvem diretamente a situação jurídica, mas indicam outras normas para solucioná-la), evolução essa representada por alguns tratados e convenções que o Brasil inclusive já ratificou.

Infere-se, desse modo, que a nova LINDB necessita de uma atualização quanto ao seu conteúdo.

Diante disso, importante citar o destaque dado pelos doutrinadores, dentre eles Jete Jane Fioratti, ao Projeto nº 4905/95, colocando-o como uma proposta de atualização ideal para a antiga LICC, sobretudo no que tange ao Direito Internacional Privado e sua atual prática.

Dentro da análise do projeto, a mencionada autora, em sua obra Direito do Comércio Internacional, destaca questões como a da autonomia de vontade das partes na escolha da lei aplicável às obrigações, prevista pelo art.11, diferentemente do que se tem com a LINDB, em que a autonomia das partes dá-se de maneira indireta, vez que se aplicará a lei do país em que as obrigações restarem constituídas, nos termos de seu art.9º.

Pelo projeto, em seu art.11,§1º, quando as partes não especificassem a lei aplicável ao contrato, este seria regido pelo direito do país com o qual o mesmo mantivesse vínculos mais estreitos.

Contudo, de acordo com a mais moderna jurisprudência internacional, a restrição desse parágrafo não se aplicaria ao caput do artigo, concluindo-se que o projeto defenderia a não existência de limitações à escolha das partes, ao se manifestarem.

Segundo a autora, o projeto introduziria ainda em nosso ordenamento a figura dadepeçage, que permite a aplicação de mais de um ordenamento jurídico sobre o mesmo contrato. Entretanto, para que não houvesse um despedaçamento excessivo do regime legal daquele, o art.11,§2º do projeto especificava que caso parte de um contrato fosse separável do restante e mantivesse conexão mais estreita com a lei de outro país, esta poderia ser aplicada, porém em caráter de exceção.

No art. 11, §3º do projeto, diferentemente do que ocorre com a lei atual, que nada estabelece, disciplinava-se a lei a ser aplicável às formalidades do contrato, tornando expresso desse modo a aplicação do principio locus regit actum, consagrado pela jurisprudência pátria.

Por ele, rege-se a forma dos atos e contratos pelas regras do local de sua celebração. O projeto, contudo, elegeu subsidiariamente a autonomia de vontade das partes, permitindo as mesmas que adotassem a lei vigente em outro país para tanto, desde que esta lei tivesse vinculação com o ato ou contrato.

Em seu parágrafo 4º, o indigitado art. 11, determinava que os contratos celebrados no estrangeiro, sobre bens situados no Brasil, deveriam ser registrados em território nacional, desde que cumprissem as formalidades exigidas pela lei local de celebração do contrato ou pela lei que as partes escolhessem para reger as suas formalidades.

Tal dispositivo espancaria incertezas quanto à interpretação existente sobre art.9º, §1º da LICC, que segundo alguns doutrinadores, obrigaria a lei brasileira a ser observada quanto às formalidades, sob pena de invalidade, quando o ato exigisse formalidades ad solemnitatem.

Outra inovação trazida pelo projeto, é a inclusão de uma regra geral para a determinação da lei aplicável relativa à qualificação. Segundo o autor Jacob Dolinger, “a qualificação é um processo técnico jurídico sempre presente no direito, pelo qual se classifica ordenadamente os fatos da vida relativamente às instituições criadas pela Lei ou pelo Costume, a fim de bem enquadrar os primeiros nas segundas, encontrando-se assim a solução mais adequada e apropriada para os diversos conflitos que ocorrem nas relações humanas”.

Segue Jete Jane Fioratti dizendo: “em suma qualificar é determinar a natureza jurídica de um fato da vida, enquadrando-os nos diversos institutos e ramos desta grande árvore que é o direito”. Qualifica é, portanto, o primeiro passo para se determinar a lei aplicável ao caso, pois a natureza jurídica deste pode ser variável diante das diversas formas de tratamento existentes de um ordenamento para o outro.

Assim, existem três critérios para qualificar um fato: o da lex fori, em que se seguem os elementos de identificação estabelecidos pela lei do foro, o da lex causae que determina a qualificação segundo a lei aplicável, indicada após a aplicação da regra de conexão, e por fim o da qualificação fundamentada em critérios autônomos e universais.

Pelo art. 16º do projeto nº 4905/95, passaria a se adotar no país o critério da lex fori, excepcionando apenas a qualificação dos bens, que seria regida pelo critério da lex causae. O aspecto inovador do projeto estaria justamente no fato de que não existe na LINDB uma regra clara sobre a questão da qualificação.

A despeito de outras atualizações e inovações trazidas pelo projeto de lei 4905/95, o mesmo foi retirado de discussão do Congresso Nacional. E como visto, parece que o legislador continua despreocupado com a defasagem em que se encontra o conteúdo do Decreto-lei 4657/42 ao se preocupar tão simplesmente com a adequação de seu nome.


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